sábado, 24 de novembro de 2012

A Obra de Anita Malfatti e a Crítica de Monteiro Lobato.

MALFATTI, Anita. O Torso.  Carvão e pastel s/ papel, 61 x 46,6 cm. 1915/ 1916

                                                                                                                                   Por Jailton Santoz

"Comprei incontinente uma porção de tintas, e a festa começou". Anita Malfatti.

No Brasil, em pleno século XXI constata-se que muitas pessoas ainda desconhecem o sentido poético e histórico da arte moderna e contemporânea. A questão é que a visão sobre o belo e obra de arte não se distingue na visão de muitos, o problema é que o reflexo da história da arte em torno do movimento impressionista, renascentista, realista em muitas situações ainda é atualidade na mente dessas pessoas, ou seja, o olhar para a estética, para a técnica, para os padrões de beleza, como na arte grega visando à cópia fiel do real, desconhecendo o lado conceitual, cognitivo, cerebral que uma obra de arte apresenta em sua proposta a partir do seu objeto pronto. Sobre tal reflexo vivenciado por muitas pessoas este texto vem destacar o exemplo da obra de Anita Malfatti e a visão de Monteiro Lobato que é bem direcionado ao que estamos propondo nesta discussão.

Anita Malfatti nasceu em São Paulo no ano de 1889, filha de um italiano e uma norte-americana. Na sua fase adulta foi estudar pintura na Europa e Estados Unidos por volta de 1990 em tempos da arte moderna na Europa. Anita busca sua expressão visual a partir de tendências expressionistas, modernas, coisa que no Brasil ainda não havia acontecido. Logo de volta ao Brasil em 1914, com 24 anos de idade resolve expor seus trabalhos, o chamado “Exposição Malfatti” que acabam se distanciando dos métodos clássicos que a sociedade brasileira principalmente paulistana tinha como “obras de arte” a partir da visão antimodernista de Monteiro Lobato que também era crítico de arte, que escancarava que esta nova tendência na arte nada mais era que um belo horror. Fruto do desconhecer a valoração da arte moderna, fruto do desequilíbrio que essas mudanças conceituais causaram.

Monteiro Lobato por sua vez critica a exposição de Malfatti no artigo “Paranoia ou Mistificação?” publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 20 de dezembro de 1917, provocando a polêmica que afastaria os seus seguidores modernistas.

“Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêem normalmente as coisas(..) A outra espécie é formada pelos que vêem anormalmente a natureza e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. (...) Embora eles se dêem como novos, precursores de uma arte a vir, nada é mais velho do que a arte anormal ou teratológica: nasceu com a paranóia e com a mistificação.(...) Essas considerações são provocadas pela exposição da senhora. Malfatti onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia”.

Resultado: rejeição da elite paulistana aos trabalhos de Anita. O estado confiava cegamente nas opiniões e gostos pessoais do autor de Urupês, e de forma imediata causou: escândalo, quadros devolvidos, uma tentativa de agressão à pintora, a mostra é fechada antes do tempo.
Ao passar do tempo os meros rótulos de modernismo no Brasil influenciados por “Lobatinho” foram se desmistificando, a exposição de Anita Malfatti funcionou como uma bomba de um movimento que explodiu na Semana de Arte Moderna de 1922 fazendo acontecer uma modernidade na arte mais livre, expressiva, conceitual e poética.

Tudo isso é muito lindo de ver. A arte tomando o seu mais belo rumo juntamente com a linha que o percurso da história desenha a todo instante.

Confira abaixo algumas obras:


A boba. 1915-16. Óleo s/ tela (61x50,5). Col. Museu de Arte Contemporânea da USP, SP.




  O Farol. 1915. óleo s/ tela (46,5x61). Col. Chateaubriand Bandeira de Mello, RJ.




 Itanhaém. 1948-49. óleo s/ tela (72x92). Col. Manuel Alceu Affonso Ferreira, SP.